3 de out. de 2010

Capitulo 27

Posted by sandry costa On 10/03/2010 2 comments

Orgulho e Preconceito


Novamente eu despertei com o sol me encarando, noutras épocas eu adoraria permanecer em casa com minha família, infelizmente, hoje era um dia que eu provavelmente não sairia da segurança de minha cama. Mas, ao mesmo tempo, considerava uma injustiça imensurável tudo o que eu estava passando e ficar remoendo os últimos acontecimentos me escondendo em meu quarto não ajudaria em nada, sendo assim, ignorei as lembranças de meu pesadelo na noite anterior e me levantei.
O ar estava levemente frio e deveria ser apenas sete horas da manhã, notei que meus pais já não estavam mais no chalé e então fui até o banheiro tomar banho, não que vampiros realmente necessitem tomar banho diariamente, afinal não transpiramos, mas é uma prática que adotei por ser extremamente relaxante, o som da água e sua temperatura quente caindo sobre meu corpo costuma curar a tensão... e ultimamente tensão era o que eu mais sentia.
Ontem eu decidi colocar em prática o meu plano para acabar de uma vez com essa situação irritante e logo que sai do banho fui até meu closet e escolhi roupas propícias para uma caminhada, calças jeans, camiseta, uma jaqueta leve de capuz e tênis. Eu estava um pouco nervosa por estar preste a fazer algo que talvez apenas viesse a piorar tudo, entretanto, não consegui distinguir outro plano de ação que me levasse a consertar as coisas...

Sempre devemos dar ouvidos aos mais velhos... não discordo deste conselho universal, as pessoas de mais idade já presenciaram coisas que os jovens ainda nem vivenciaram, entretanto, nem sempre devemos fazer tudo como está escrito nos livros. Eu sempre me considerei uma filha exemplar, nunca fui do tipo rebelde sem causa apesar de sofrer com o modo com que os humanos tratam este mundo, mas fico realmente descontente em receber tantas críticas por ter errado pela primeira vez diante desta família... o pior é que não me arrependo do que fiz.
Parece que não tenho o direito de aprender com meus erros, a essência do problema talvez seja o modo antiquado e idealizado com que meu pai vê o mundo... ele considera que tudo é perfeito quando, na realidade, não é. Eu nasci com um século de diferença dele, as tradições, dogmas e conhecimentos da minha época são infinitamente distintos daqueles do início do século XX, ele me culpa por eu ter feito amor com Jacob antes do casamento.
Eu não digo que isso não seja lindo, a idéia sacra da castidade... eu não concordo com a juventude de hoje que saí por aí fazendo sexo indistintamente, a irmã de um colega meu da escola está grávida e ela tem apenas quatorze anos de idade, eu considero isso um escândalo. O que as pessoas não compreendem é que meu caso com Jacob é totalmente diferente do de uma relação comum, as pessoas se casam justamente porque compreendem que desejam passar o resto de suas vidas juntas... eu e Jake já sabemos disso e não somos apenas um “casal de fim de semana”, vamos ficar juntos para sempre. Então eu tomei a decisão de não esperar, não fazia sentido, se eu tenho certeza que ficarei com Jacob para sempre e sei que iremos nos casar e que eu jamais teria outro homem em minha vida e em meu coração... porque postergar um enlace tão íntimo que é, para mim, o envolvimento absoluto em uma relação?
Mas esta é a minha maneira de encarar a situação, meu pai a vê de outra forma e sob um ângulo muito mais conservador... eu não o culpo, afinal, todos possuem uma visão diferente acerca do mundo e de tudo o que nos cerca. O que não suporto é a falta de tato, a falta de tolerância para com as pessoas que pensam de forma diferente... afinal, não tenho eu o direito de pensar desta forma? Acredito que muitas pessoas deixariam de gostar de mim ou me censurariam se eu expusesse os meus pensamentos sobre isto, mas, afinal, que força consensual dá a elas o direito de estarem certas e eu errada? 
Não, eu não recuarei, eu não permitirei que eles me convençam de que eu estou errada, tudo o que fiz... eu fiz com amor, fiz por Jacob e se eu recuar e admitir que cometi um erro eu estarei traindo o amor que sinto por ele e isso eu não farei jamais. Eu permitirei que as pessoas me atirem as pedras como se elas jamais houvessem cometido um pecado, eu permitirei que me maltratem, que me censurem e que me insultem... mas jamais recuarei quando meu coração está limpo e livre e me diz que o que fiz eu fiz por amor. Eu fiz sem pecado ou mágoa...
Eu não me arrependo por ter feito amor com Jacob naquele crepúsculo... eu não me arrependo nem por um segundo por tê-lo amado porque aquilo apenas aumentou o que sinto por ele... apenas aumentou o meu amor que já era eterno... e eu não irei permitir que alguém me diga que o que fiz foi errado. É errado matar, errado é roubar, errado é falar mal da vida alheia, errado é desejar mal para os outros... agora amar? Quando é que o amor se transformou em pecado? Quem têm o direito de dizer que amar alguém é pecado?
Eu não ficarei longe de Jacob devido ao pensamento das pessoas, à sua forma de encarar o mundo, suas tradições, seus dogmas ou seus ensinamentos. O amor não precisa disso, é só o amor que conhece o que é verdade, só o amor reconhece o bem e só o amor é capaz de transpassar todas as barreiras do caos e da maldade do mundo... não, eu não recuarei porque tudo que farei será em nome do amor e coisa alguma será capaz de me deter.
Eu deixarei os maldosos com sua mente repleta de preconceitos, deixarei os invejosos com sua inveja pútrida e corrosiva, deixarei os fanáticos com seu fanatismo exacerbado e deixarei aqueles que nunca amaram sem qualquer reposta porque estes são os que menos merecem uma explicação.

Atravessei decidida a trilha que levava até a casa de meu avô, barrando-me o caminho, o extenso e caudaloso rio Sol Duc corria tranqüilo e faiscava sob raios do sol, o céu de anil sorria para mim e eu respirei fundo antes de atravessar o rio com um único salto. Meu coração explodia frenético em meu peito e o meu medo foi aumentando à medida que eu avistava o quintal da mansão, eu estava prestes a confrontar o meu pai e lutar pelo meu direito de amar Jacob sem restrições... se ele não aceitar as minhas escolhas eu fugirei para La Push e só voltarei quando ele parar com toda esta bobagem.
Prendi a respiração antes de entrar na casa, a cozinha estava vazia mas eu ouvi o murmúrio de vozes alegres vindo da sala... desconfiada me dirigi até lá. Havia um alvoroço e todos conversavam animados, notei que as mulheres da família estavam com trajes de caminhada e os homens, estranhamente, vestiam roupas mais folgadas e usadas. Minha mãe me viu e disse um surpreso bom dia... notei que ela estava meio sem graça.
- Achei que você acordaria bem mais tarde hoje, querida! 
- Porque eu faria isso, mãe?
- Você anda perdendo até a noção dos dias, Renesmee? - riu Emett – Hoje é sábado... 
De fato, perdi a noção... sábado era o dia em que eu costumava dormir até mais tarde.
- Aonde vocês vão? - eu perguntei desinteressada.
- Bem – disse minha mãe e agora ela realmente parecia estar sem graça – Suas tias, eu e sua avó vamos até um local que Alice encontrou no Canadá em nossa ultima viagem... uma parte da floresta onde brotam várias orquídeas lindas e sua avó quer coleta-las e enxertá-las nas árvores aqui do jardim.
- Você iria sair sem me avisar? - eu perguntei chateada e ela percebeu isso.
- Não... – gaguejou minha mãe – Eu pensei em... deixar um bilhete, é que.. bem...você...
- Ainda está de castigo – bradou a voz forte de meu pai, ele não olhou para mim – E não pode sair... eu permiti que Seth te levasse dar uma volta porque não desejei me indispor com ele.
Neste instante eu não contive a minha raiva e pensei um palavrão bem alto, como um raio meu pai me encarou fuzilando-me com os olhos, eu tinha tanto a dizer a ele, tanto a gritar e protestar... eu queria que todo o meu sofrimento fosse atirado em sua cara... mas, diante de seu olhar firme e inflexível a minha revolta morreu em minha garganta antes mesmo de chegar aos meus lábios.
- Me desculpe – eu sussurrei para ele baixando o olhar.
- Seu avô Charlie nos convidou para ir pescar com ele, não é uma pratica muito apreciável por nossa família mas Carlisle achou deselegante rejeitar o convite, além do mais, creio que seus tios, seu avô e eu merecemos algumas horas de lazer... mas você ainda continua de castigo e não deixará esta casa. Você me entendeu, Renesmee? - meu pai perguntou diante do olhar de todos.
- Sim, senhor. – eu respondi simplesmente, sem erguer os olhos.
- Kaori ficará em casa e me fará o favor de dar uma olhada em você... ela ficou de me avisar caso você resolva quebrar o seu castigo e sair de casa – e com isso meu olhar se incendiou novamente para meu pai, ele provavelmente leu a minha mente e descobriu que eu planejava fugir para La Push, num segundo eu avistei Kaori com aquele rosto inexpressivo e detestável, senti uma vontade louca de insultá-la, mas neste momento meu pai leu meus pensamentos e falou novamente sem se importar com minha humilhação – E, obviamente, eu sei que você não faltará com o respeito a Kaori uma vez que ela é nossa convidada.
- Sim, senhor. – eu tornei a responder resignada, mas minha raiva estava me sufocando, eu lutei mais uma vez contra as lágrimas que sempre me escapavam quando eu ficava irritada, meus olhos cintilaram úmidos e eu senti a dor no rosto de minha mãe.
- Eu posso ficar em casa também... Alice não se importaria. – ela disse baixinho para meu pai.
- Não seja absurda, Isabella – meu pai respondeu chamando minha mãe pelo seu nome completo o que significava que ele não aceitaria sua proposta – Renesmee irá cumprir exatamente o que eu pedi, a não ser que nossa filha seja capaz de demonstrar uma falta de respeito ainda maior para com seus pais.
- Eu ficarei bem, mamãe – eu disse mal contendo as lágrimas e odiei o fato de minha voz ter falhado um pouco – Bom divertimento para vocês... eu estarei no meu quarto. 

Eu malmente tinha chegado ao quintal e o choro tomou conta de mim, atravessando o rio eu quase me choquei contra uma árvore enquanto pousava no chão porque as lágrimas nublavam a minha visão, não sei como consegui chegar até o meu quarto... mas, uma vez lá, me atirei sobre a cama enterrando meu rosto nos travesseiros e chorei durante horas.
Eu era uma covarde, fui até lá para enfrentar o meu pai e não consegui... eu não consegui e agora Jacob estava ainda mais distante porque meu pai não parecia nem um pouco propenso a nos perdoar pelo que fizemos... e foi assim, em meu desespero solitário e soluçante que eu adormeci.
Quando acordei já passava do meio-dia e eu resolvi sair e me sentar na varanda da minha casa para olhar o céu azul... o céu sempre me acalmava, fiquei durante um tempo admirando as nuvens multiformes que singravam insones pelo infinito de anil, o sol aquecia minha pele de mármore que se refletia numa miríade infinita de pequenos pontos de luz.
Eu não pensava em nada e me concentrava em esquecer a minha dor quando um som me despertou de meus devaneios, era como se alguém houvesse agitado uma vara ou um comprido galho de árvore velozmente pelo ar, eu conhecia este som porque era o som que vampiros faziam ao se deslocarem... o som como um vento veloz cortando a mata.
Eu abri os olhos e ali, no limiar da floresta, Kaori me olhava sem jeito.
- Me perdoe... – ela falou encabulada – Não foi a minha intenção assustá-la.
- O que você quer? - eu tentei parecer a mais educada possível.
- Nada, apenas vim até aqui para ver como você está.
- Você veio até aqui para assegurar que eu não tivesse fugido – eu a acusei.
- Não... claro que não. – ela afirmou.
- Escute, eu estarei aqui comportadamente prisioneira da minha casa, não se preocupe... pode ir embora.
- Eu não vim aqui com este intuito.
- Imagino que não... – eu respondi sentindo a minha raiva crescer e seria pior para Kaori porque ela seria a vítima de toda a minha mágoa – Assim como também nunca imaginei que meu pai estaria mancomunado com você.
- Edward apenas me pediu um favor.
- Claro, e você faz questão de agradar em tudo a minha família. – eu frisei bem as duas ultimas palavras para que ela compreendesse que eu a considerava uma estranha.
- Eu devo muito a eles. – Kaori resumiu com aquela sua voz irritantemente baixa.
- É, que bom que alguém aqui está gostando de participar desta família.
- Renesmee – Kaori disse com o cenho franzido – Eu entendo que você esteja chateada com a sua família mas todos a amam e seu pai principalmente... tudo aconteceu muito recentemente, acho que você deveria dar um pouco mais de tempo para eles.
- Nossa, que maravilha, até você querendo me dar conselhos agora? - eu falei com escárnio.
- Eu apenas tento ajudar.
- Sabe, Kaori, eu nunca havia reparado no quanto você é boazinha.
- Eu entendo que você não goste de mim.
- Então sugiro que você volte para a casa de Carlisle. – eu literalmente cuspi as ultimas palavras.
- Eu não posso permitir que você faça alguma coisa de que vá se arrepender depois.
- Permitir? - eu gritei com ela – Como você ousa querer permitir alguma coisa em minha vida? Você caiu de pára-quedas na minha família e vive na casa do meu avô como um fantasma, eu tropeço em você pelos cantos porque você parece um espectro de ser humano. Não venha me dizer que não foi junto com eles para ficar me vigiando, não finja tanto, você tem pavor de sair de casa... e faz isso porque é uma covarde.

Kaori não me respondeu, apenas me olhava com aquele olhar impassível e com uma expressão de resignação no rosto, eu a encarava e via apenas um fantasma, vai ver era por isso que eu não gostava dela... nunca conheci um ser tão sem vontade de viver como ela.
- Eu não sou como você – eu continuei meu ataque – E só para provar isso, vou sair daqui e ir até a casa de Jacob e ficarei lá até que meu pai aceite tudo isso... ou nunca mais voltarei para cá.
- Renesmee, isso não é uma boa idéia.
- Mas é claro que não, não é mesmo? Você jamais faria algo assim e sabe por quê? Porque você não tem um único pingo de coragem dentro deste corpo sem graça. Eu ficarei com Jacob e meu pai não será nem doido de tentar me tirar de lá à força... caso contrário ele comprara uma briga imensa com uns quarenta lobos bem fortes.
- Você não faria isso – e desta vez Kaori me olhou com uma expressão de choque, ela se aproximou de mim e eu até recuei um pouco diante desta manifestação repentina de vida – Você realmente quer que seu pai entre em conflito com Jacob e os lobos? Mas onde é que você está com a cabeça, Renesmee?
- Eu não tenho outra escolha – eu respondi teimando.
- Você não está dando valor para a família que tem... muitas pessoas morreriam para ter o que você possui aqui – ela falou e havia um traço de impaciência em sua voz.
- O quê? - eu rebati, não daria de forma alguma o gostinho de ser silenciada por Kaori – Uma família que só me julga? Um pai que não me compreende, até mesmo a minha mãe iria sair hoje escondida de mim...
- Ela não queria te magoar, Bella estava infeliz por não poder te levar junto... você está falando coisas que não sabe.
- Claro que não sei... afinal, eu não tenho o seu privilégio de estar com minha família porque eles me renegaram.
- Ninguém renegou você, menina... – e Kaori também estava gritando.
- Eu não preciso deles... – eu gritei de novo, claro que nesta altura eu não falava coisa com coisa e nem mesmo a verdade, eu apenas queria marcar o meu território e eu não daria o braço a torcer logo para Kaori cuja pessoa eu detestava mais a cada segundo.
- Precisa sim, todos precisam de uma família, você já se imaginou sem a sua?
- Bom, é o que descobriremos agora... porque eu estou indo embora – eu me virei dando as costas a Kaori mas senti um aperto de ferro segurando meu braço... subitamente eu pressenti algo ruim porque a briga entre dois vampiros nunca acabava bem.
- Solte o meu braço ou eu juro que acabo com essa sua vidinha miserável.
- Eu não tenho nada a perder, menina. – ela retrucou não me soltando.
- Nossa, Kaori, que pena que não mostrou este vigor todo quando precisamos dele no momento em que aqueles estranhos estavam atrás de você e você se escondeu sob as asas do meu namorado.
- Eu só estou assim devido à besteira que você pretende fazer... colocar em choque o seu namorado e sua família, você sabe que os lobos defenderiam Jacob e isso pode acabar em uma desgraça... você esta sendo egoísta, Renesmee.
- Ao menos estou fazendo o que meu coração manda... não vou cometer o mesmo erro que você. – e então eu percebi que havia atingido o ponto vital... um direto bem na jugular, Kaori me soltou no mesmo momento se afastando de mim com um reflexo de dor no rosto.
- Do que está falando?
- Que você teve a chance de salvar o seu filho quando aquele homem mandou que saísse pelos fundos da casa... você poderia ter uma chance de se salvar e, ao contrário, saiu pela porta da frente e deu de cara com o monstro. Eu não vou ficar com medo como você ficou.
- Você não sabe o que está dizendo. – ela arfou.
- Eu vou dizer uma vez só, Kaori, e é bom que você me escute. Eu vou sair e irei até La Push ficar com Jacob e você não vai me impedir, para mim você não passa de um fantasma condenado que perdeu tudo e ficou vagando por aí feito uma alma penada. Você nem mesmo é uma vampira porque vampiros, apesar de não terem um coração batendo, possuem sentimentos tão intensos quando os humanos... mas não você, você morreu no momento em que aquele vampiro lhe mordeu, tudo o que resta é uma casca vazia e sem vida. Se você não quer mais viver, Kaori... problema é seu, mas não ouse me impedir de ir atrás do que quero, porque eu, ao contrário de você, amo a minha vida.
Eu me virei e saí rumando para o interior da floresta profunda e desta vez Kaori não me impediu, eu não a ouvi me seguir, reclamar ou telefonar para meu pai, ela apenas permaneceu parada com o rosto inexpressivo e sem reação... como já era de se esperar dela.

Eu corri o mais rápido que pude, o vento silvava em meus ouvidos enquanto eu desviava agilmente ziguezagueando por entre as árvores, a mata estava bonita hoje com os raios de sol colorindo o verde das folhagens mas eu malmente percebi isso. Meu coração pesava assim como a minha consciência, eu senti isso a cada passo dado e a cada batida arrítmica de meu coração e eu sabia o porque: remorso. Eu jamais havia tratado alguém mal ou faltado com o respeito de forma deliberada, jamais ousei gritar com alguém como gritei com Kaori... com raiva; meus pés diminuíram a velocidade e logo eu caminhava pela floresta com o passo mais lento que o de um humano, assim que a corrida frenética cessou eu percebi que mais uma vez as lágrimas corriam por meu rosto, não fazia nem cinco minutos que eu corria mas provavelmente já havia me afastado uns 15 ou 20 quilômetros de minha casa... então parei e me sentei na relva fresca cobrindo o rosto com as mãos.
Eu arfava e não conseguia respirar ou pensar direito, me sentia a pior pessoa da face da Terra, havia acabado de insultar e humilhar outra pessoa e isso me destruía por dentro... afinal, o que estava acontecendo comigo? Eu nunca fui assim! Jamais insultei alguém na vida, minha família teria razão em me tratar diferente uma vez que eu parecia ser outra pessoa? Não pode ser, eu continuo a mesa Renesmee de sempre... mas, se sou a mesma, por quê agi daquela forma com Kaori? 

Eu sei porque... duas palavras: Orgulho e Preconceito.

Eu fui orgulhosa demais para permitir que ela me falasse a verdade e meu preconceito com ela falou mais alto impedindo que eu raciocinasse durante a discussão. Eu não gostava de Kaori e por motivo algum, no início foi por ciúmes de Jacob mas eu sabia que ele jamais se interessaria por ela... depois eu desgostei dela por nada, isso é preconceito... simplesmente antipatizar com uma pessoa por motivo algum. Eu fui orgulhosa... não permiti que ela tentasse me ajudar e além disso a insultei e a magoei.
Que Renesmee era essa que magoava as pessoas? Com certeza não era eu.
O que eu estava prestes a fazer poderia colocar em atrito a minha família e Jacob, foi a atitude mais impensada e egoísta que eu tomei na vida, mais uma vez meu pai ficaria chateado comigo e desta vez ele teria razão por que eu fui uma tola. Eu tinha que aprender a controlar melhor estes hormônios da adolescência ou poderia enveredar para um caminho sem volta... jamais poderia viver sem minha família.
Então me levantei secando as lágrimas de meu rosto com as mãos... eu não daria mais vazão a estes impulsos irracionais que tomavam meu coração, lentamente retomei o caminho de volta para casa disposta a falar com Kaori e pedir-lhe desculpas por tudo... era hora de deixar o orgulho de lado e acertar as coisas. Decidi que também era hora de falar com meu pai, mas não com raiva ou rancor... e sim para explicar-lhe o que eu sentia e para lhe pedir perdão, uma coisa que eu lembrei que até então não tinha feito. Jacob tinha razão, mesmo não estando arrependida pelo que fiz eu devia desculpas a meu pai.

Meus pés se moviam lentamente em direção a minha casa, meu orgulho tentando alfinetar meu coração novamente... mas eu já estava decidida e não voltaria atrás, entretanto, enquanto caminhava eu detectei o ruído de quatro patas fofas pisando pelo chão da floresta, imediatamente procurei no ar o cheiro do lobo que vinha em minha direção com meu coração pulsando de saudades de Jacob mas, antes de senti-lo eu já sabia que não era Jake... era um lobo pequeno demais.
Apressei-me em direção ao som e subi agilmente uma pequena colida de onde uma árvore imensa espalhava seus galhos argutos até o chão e de lá de cima eu o avistei, correndo para mim um lobo de coloração cinza claro com o a língua alegremente pendendo para fora da boca... Quilan. Quando ele chegou perto de mim eu o abracei com força tentando matar a saudade que sentia do meu lobo, o corpo quente de Quilan tinha um cheiro levemente amadeirado e ele já alcançava uma altura superior à minha cintura apesar de ter apenas cinco anos de idade. Eu segurei sua cabeça e ele abriu um sorriso lupino para mim.
“Oi, Quilan” – eu pensei rindo enquanto me comunicava com ele através do meu dom.
“Oi, Nessie... você está perdida de novo?” ele perguntou, sua vozinha infantil invadindo minha mente como um vento cálido de primavera.
“Não querido, eu já estou voltando para casa.”
“Ah” – ele disse envergonhado... Quilan tinha vergonha de nós, não sei porque... tadinho.
“Mais algum lobo está transformado?” – eu perguntei na esperança que Jacob estive por perto na forma de lobo.
“Não, só eu... e na verdade estou assim escondido da minha mãe”.
“Escondido de Leah? Por quê?”
“Ah, eu não posso me transformar quando não tem mais ninguém para sair comigo...”
“Então, você fugiu?”
“Sim” ele respondeu baixando o olhar par ao chão.
“Bem vindo ao clube então, fofinho” – eu disse para ele “Porque eu também estava fugindo”.
“Sério?” – ele me encarou, os olhos cintilando – “Por quê?”
“Bem, digamos que eu fiz uma coisa que não deveria ter feito e todos ficaram chateados comigo...”
“Você brigou com o Jake?”
“Não, querido, não foi com o Jake que eu briguei... foi com o meu pai, mas é uma longa história e sobre coisas que você ainda não tem idade para compreender...” – eu respondi afagando os pelos de sua cabeça.
“Não sei como alguém pode ficar bravo com você... você é legal, linda e eu gosto muito de você... apesar de você cheirar mal.” – Quilan falou enquanto me dava uma lambida de lobo no braço.
“Ah, eu cheiro mal?” eu disse rindo, era tão fácil conversar com Quilan, os quileutes tinham uma maneira especial de ser, era sempre tranqüila a convivência com eles porque viviam em paz com tudo e sempre tinham um humor tão natural... gostaria de ser assim
“Não como seus pais... você cheira como um humano que cheira mal, entende?”.
“Acho que sim, mas me conta, por quê você fugiu de casa?”
Quando perguntei isso, Quilan se deitou na relva ao meu lado e soltou um suspiro profundo, havia alguma coisa realmente o incomodando.
“Ah, aconteceu uma coisa ruim.”
“Que coisa, Quilan? Pode me contar... eu juro que não comento com ninguém”.
“Você sabe que meu pai não é Quileute?” – eu assenti e ele prosseguiu – “Quando meus pais se casaram minha mãe fez um acordo com meu pai de que eles morariam na Reserva desde que o filho deles estudasse na cidade... meu pai permite que Sam ensine todas as tradições de nosso povo para mim mas, ao mesmo tempo, eu tenho que estudar na escola dos brancos”.
“Entendo.” 
“E você sabe o problema que os lobisomens têm, não é mesmo?” – ele me perguntou me lançando um olhar encabulado.
“Problema?” – eu perguntei, mas um segundo depois já havia compreendido do que se tratava – “Meu Deus, Quilan, você teve uma Impressão?” – eu perguntei horrorizada.
“Sim.” – ele respondeu numa voz fraquinha – “Mas ela me detesta.” – Quilan disse isso com tristeza.
“Como ela é... espere, apenas pense nela que eu poderei ver, está bem?”

E ele pensou; a sala de aula era ampla e bem iluminada e havia pelo menos trinta alunos na classe de Quilan, em sua frente uma menina bonita com seus cinco anos de idade olhava-o com reprovação; ela tinha os cabelos louros e os olhos incrivelmente azuis, sua boca pequena se emoldurava angustiada em seu rosto, ela segurava um lápis de cor quebrado em sua mão.
- Você é atrapalhado demais, veja, você quebrou meu lápis... eu não sei porque você não estuda na escola dos índios, eu não gosto de você. – e dito isso ela se afastou para longe.
Aquilo fez meu coração parar, a menina fez com Quilan o que eu havia feito com Kaori, eu não condenei a menina porque ela era apenas uma criança e estava zangada porque Quilan quebrara seu lápis de cor... mas eu pude sentir a angustia do pequenino lobo porque foi ele quem fora insultado e humilhado quando foi rotulado de índio... imaginei como estaria o coração de Kaori neste momento.
Quilan deu um ganido de infelicidade e eu senti pena dele, parecia tudo tão injusto... como a natureza permitia que uma criança de cinco anos de idade tivesse uma Impressão sendo que um adulto como Seth ainda não teve a dele? Quilan era pequeno demais para lidar com toda a grandiosidade do amor... mesmo eu que era mais velha não conseguia suportar direito este fardo. 
Eu me deitei ao lado dele na relva e fiz carinho em sua cabeça, Quilan fechou os olhos e eu sentia que ele estava triste...
“Como ela se chama?” – eu perguntei.
“Natalie”
“Sabe, Quilan, a Natalie ainda é muito criança... vocês dois são. Ela falou aquilo porque estava chateada com você e não por ser verdade, você verá que quando vocês dois crescerem ela vai perceber, em algum momento, que também gosta de você. Foi assim comigo e com Jacob”.
“Sério?” – ele levantou a cabeça para me olhar.
“Sim, Jacob teve sua Impressão quando eu ainda era um bebê e no começo eu gostava dele como um irmão, depois como um amigo até que finalmente descobri que o amava. Além do mais, acho que você não deveria se preocupar tanto assim, por enquanto seja apenas um amigo da Natalie e sempre esteja por perto quando ela precisar... no momento certo quando vocês forem mais velhos... ela irá gostar de você. Tudo tem seu tempo”.

E então eu me espantei comigo mesma. “Tudo tem seu tempo” foi o que eu disse, e era justamente o que todos me diziam... para eu ser paciente porque as coisas aconteceriam em seu devido tempo, agora eu pude compreender um pouco o porque de meu pai ter ficado tão chateado. E ali, com Quilan ao meu lado eu me senti aliviada e feliz, meu coração estava leve novamente, eu havia voltado a ser eu mesma... a mesma garota de sempre e era uma sensação maravilhosa. 
“Sabe, nós podemos ir até a minha casa e pegar um lápis de cor para você devolver para a Natalie... o que você acha?” – eu disse enquanto me sentava.
“Sério?” – Quilan perguntou se levantando e balançando o rabo alegremente.
“Claro que sim, querido. Eu tenho um monte de lápis de cor sobrando...”
“Obrigado, Nessie... você é muito legal” – ele falou enroscando sua cabeça em meu colo.
“Bem, eu não acho que seja mais tão legal assim”. – eu comentei com a culpa ainda remoendo minhas entranhas.
“Se você não fosse legal eu não estaria aqui com você” – disse Quilan com tanta sinceridade que eu não pude deixar de sorrir. Levantei-me rápido e comecei a caminhar com mais leveza de volta para minha casa, Quilan me acompanhando saltitante pela mata da floresta.

Eu seguia feliz comigo mesma, senão feliz ao menos mais tranqüila e meu coração, apesar da saudade de Jacob, estava menos nublado que antes... pelo caminho eu colhi algumas flores do campo para entregar à minha avó, Esme adorava flores do campo... Quilan ia saltitando pelo caminho tentando abocanhar algumas borboletas que voavam em volta dele. O sol da tarde brilhava límpido e o contraste do verde das árvores com o azul do céu tornava a floresta um local de sonhos, as folhagens viçosas espalhavam-se por todos os lados e pássaros alegres cantavam ocultos em seus ninhos nas árvores... tudo estava em seu perfeito lugar.
Nós havíamos caminhado menos de dois quilômetros quando, repentinamente, Quilan parou rígido sobre uma pequena elevação no solo, suas orelhas em pé e alerta enquanto ele virava sua cabeça para um lado e para o outro, ele ergueu seu focinho e tentava farejar um odor no ar como se procurasse algo oculto na mata. Eu me aproximei dele e toquei com a mão seu torso felpudo.
“O que foi, Quilan?”
“O cheiro estranho está aqui!” – ele declarou com a voz desconfiada.
“O cheiro estranho?” – eu perguntei não entendendo o que ele quis dizer.
“Sim... o cheiro estranho. Aquele que os lobos não conseguiam seguir, um cheiro que coçava nossos focinhos... o cheiro dos estranhos”.
Então senti meu coração pular um compasso e se congelar em meu peito, Quilan farejou o cheiro dos intrusos que rondavam nossa casa, mas não podia ser... eles já haviam partido e nós passamos meses procurando-os sem encontrar nada.
“Você tem certeza, Quilan?”
“Sim, além do cheiro eu estou ouvindo o som... é um som baixo, você não ouve?”
Eu sabia que os sentidos dos lobos eram muito mais sensíveis que os dos vampiros, então me concentrei apenas em minha audição procurando limpar todos os outros sons da floresta; havia sons de pássaros e de insetos, um coelho passou correndo para sua toca a centenas de metros, um gavião planava a quilômetros acima de nós, um cervo corria em direção ao sul... e então eu ouvi, havia um som estranho no limite da audição, um zunido baixo semelhante a uma leve brisa ondulando o capim alto, estava lá... e o cheiro também. Os vampiros têm um cheiro próprio e comum, algo semelhante ao das flores das cerejeiras... algo doce, sensível e acolhedor que envolve o ambiente onde ele está, por isso os humanos são atraídos por nós, exalamos no ar este cheiro agradável e adocicado que os atraem até nós como presas a serem subjugadas. Mas estes vampiros eram diferentes, o seu odor era quase inodoro, uma levíssima sombra do cheiro real de um vampiro, mas, definitiva e inquestionavelmente era um vampiro.
“É um vampiro!” – eu falei para Quilan.
“Não, são três.” – ele me corrigiu.
“Tem certeza? Eu mal posso ouvir o som de um deles”.
“Tenho certeza sim, e eles podem estar próximos. Eu lembro que nós nunca conseguíamos saber a qual distância eles estavam de nós... acho melhor corrermos para sua casa”.

Quilan não esperou o meu consentimento e disparou na frente, eu corria o máximo que pude e percebi que o pequeno lobo ficava para trás, afinal, Quilan ainda era uma criança e muito menor que os lobos adultos de sua matilha. Sendo assim, eu diminui a velocidade para ele poder me acompanhar, meus olhos perscrutaram todos os cantos da floresta em busca de algum estranho prestes a surgir em nossa frente... mas não vi nada, devido à corrida eu também deixei de ouvi-los e sem me concentrar jamais poderia captar seu cheiro estranho.
Então, subitamente, Quilan parou derrapando pelo solo, os dentes afiados expostos e um leve rosnado escapou de sua garganta.
“Eles estão aqui...!” – ele me disse no momento em que me ajoelhei ao seu lado.
Foi então que eu vi o que Quilan viu... ou melhor, não vi. Tudo o que pude distinguir eram as folhas secas das árvores sendo jogadas para o ar como se um vento veloz passasse por ali as soprando para cima, o ar se encheu de um sibilo baixo como o bater das asas de uma mariposa... eram tão velozes que mesmo meus olhos de vampira não eram capazes de captar seu movimento. De repente, risadas encheram a floresta ecoando por entre as árvores... risos malignos e maliciosos chegaram até nós fazendo meu coração disparar e minha pele arrepiar-se, eu agarrei Quilan mas não deixei de me sentir totalmente sozinha e desprotegida.

Subitamente, eles surgiram em nossa frente... eram três como havia afirmado Quilan. Eram vampiros com certeza mas eu jamais vi vampiros surgirem assim do nada, foi como se eles emanassem do solo ou como se um véu de invisibilidade se descortinasse de suas cabeças e eles surgissem na floresta como se sempre estivessem ali. Havia um vampiro parado na frente dos outros dois e parecia ser o líder, ele era imenso... alto e forte como Jacob e seus olhos vermelhos faiscaram com o sol, vestia roupas caríssimas que pouco condiziam com a floresta selvagem... um sorriso cruel se desenhou em seus lábios pálidos.
- Ora, ora, ora... – ele disse com uma voz sedutora – O que temos aqui?
- Finalmente... após tanto tempo de espera. – falou o vampiro da direita que era velho e sua voz tinha um sotaque estranho que eu jamais ouvira na vida.
- O que vocês querem? - eu perguntei na voz mais corajosa que consegui emitir.
- Ah, minha querida – falou o líder – Nós queremos você!
- Acho melhor partirem, os amigos dele estão por perto. – eu falei apontando para Quilan.
- Não, não, não – retrucou o vampiro sorrindo de forma maligna – Nós sabemos que não há mais nenhum lobo por aqui e que vocês dois estão sozinhos... acho melhor vir conosco por bem, minha querida menina.
- Não se aproximem de nós. – eu gritei.
- Eu pego a garota... vocês dois cuidem do lobo. – o vampiro líder ordenou ainda com um sorriso nos lábios.
- E o que fazemos com ele? - perguntou o velho.
- Matem-no... ele não interessa a nossos mestres.

Eu senti meu estômago despencar e meu coração falhar quando o vampiro deu a ordem, então, rápido como um raio ele se moveu em nossa direção... parecia um borrão de ódio e eu só tive tempo de empurrar Quilan para o lado a fim de tira-lo do caminho. Mas isso custou à oportunidade que eu tinha de me defender, mal tive chance de levantar as mãos quando fui atingida no rosto por um golpe poderoso, meu corpo foi lançado no ar por vários metros até se chocar contra uma árvore cujo tronco estalou e se desintegrou... eu caí de joelhos no chão e minha visão falhou perigosamente.
Ouvi os latidos de Quilan e me forcei a ficar em pé mas minha cabeça girou e eu caí no chão novamente, senti na boca o gosto ferruginoso do meu próprio sangue... essa era a pior parte de ser uma meia-vampira, eu suportava muito menos uma surra do que um vampiro puro. Apoiei-me no tronco despedaçado da árvore e vi que Quilan corria e lutava com o vampiro mais novo que estava com eles enquanto o velho apenas gargalhava e assistia a luta... pelo canto do olho notei o vampiro mais forte vindo vagarosamente em minha direção.

Minha visão falhou novamente... o golpe foi muito forte, eu toquei meu rosto e percebi horrorizada que minha pele de mármore estava trincada e um pó fino e brilhante se desprendia dela... o sangue corria dentro de minha boca e eu não consegui me manter em pé...

E apesar de todo o meu medo eu só pensava em Quilan... eles iriam matá-lo.

E, antes de minha visão obscurecer completamente, eu ainda tive tempo de ter um último e derradeiro pensamento:

“Realmente... não foi uma boa idéia ter vindo sozinha até a floresta”.



Autor Angus

2 comentários:

Tudo de bom, maravilhoso, perfeito!!!! Muito obrigada por ser do POV da Nessie... Posta logo o próximo que eu tô bege de curiosidade!!! :p
P.S. Por favor, não mate o Quilan?!?!?!!!

Ahaha... todo mundo me pede isso... ahahaha
Nao mate o Quilan... nunca imaginei que um filhote de lobo chamaria tanta atenção.

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