Saudade Dói
PEDAÇO DE MIM
(Chico Buarque)
Oh, pedaço de mim
Oh, metade afastada de mim
Leva o teu olhar
Que a saudade é o pior tormento
É pior do que o esquecimento
É pior do que se entrevar
Oh, pedaço de mim
Oh, metade exilada de mim
Leva os teus sinais
Que a saudade dói como um barco
Que aos poucos descreve um arco
E evita atracar no cais
Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mim
Leva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu
Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
É assim como uma fisgada
No membro que já perdi
Oh, pedaço de mim
Oh, metade adorada de mim
Leva os olhos meus
Que a saudade é o pior castigo
E eu não quero levar comigo
A mortalha do amor
Adeus
A saudade que Edward sentia de Bella era tão grande que doía em sua pele, seus órgãos, sua cabeça. Era como se lhe faltasse um pedaço... Precisamente sua melhor parte.
Não eram apenas de seus olhos verdes, de seu cheiro e do seu sorriso que Edward sentia falta, eram também dos sentimentos nobres e puros que ele tinha quando estava junto dela... Sentia falta do menino por quem ela foi apaixonada um dia.
Desde que viera para a América, traindo da forma mais torpe a única mulher que amou (e ainda amava), Edward nunca mais havia se sentido digno de aproximar-se de Bella. Preferiu afastar-se completamente, pois se descobrira uma pessoa fraca e medíocre, que tinha colocado a fortuna do pai como requisito básico para ser feliz. Hoje via o quanto estava enganado naquela época, mas agora era tarde e só lhe restavam o arrependimento e a saudade. Para ele Bella merecia alguém melhor.
Porém algo estava mudando dentro de Edward. O sofrimento e a vergonha que trouxe consigo da Inglaterra serviram de incentivo para uma tomada de atitude. Em cinco anos se tornara um homem do qual começava a se orgulhar. Independente, trabalhador, responsável e, principalmente, confiante.
O arrependimento do que fez a Bella era como uma lâmina cortando sua carne dia e noite... Mas também era sua redenção. Usava seu sofrimento como uma penitência, como o preço que tinha de pagar por seus erros.
Ed Masen era um homem digno e era ele quem desejava ardentemente reencontrar Bella. Precisava vê-la nem que fosse uma única vez, nem que fosse para ouvir dela as mais bárbaras acusações. Queria pedir-lhe perdão, mesmo duvidando que o receberia.
... “Que o espelho reflita em meu rosto
um doce sorriso que eu me lembro
ter dado na infância.
Porque metade de mim é a lembrança do que fui
E a outra metade eu não sei”...
A saudade que Isabella sentia da mãe doía como uma ferida aberta em seu peito. Renée tinha sido a única pessoa que a tinha amado de verdade, acreditava Bella, mas infelizmente a morte a levara tão precocemente... Seu coração não agüentou as desilusões que teve. Serem abandonadas pelos homens que amaram era algo que elas tinham em comum, mas ao contrário da mãe, que transformou a dor em mágoa e a mágoa em doença, Bella tinha transformado a sua dor em raiva e ódio.
Evitava pensar em Edward Cullen, mas quando o fazia era com muito rancor. Já tinha conseguido esquecê-lo. Ele agora era apenas um erro do seu passado.
O amor se foi, mas as seqüelas ficaram. Bella não acreditava mais na felicidade. Apenas levava sua vida, dia após dia, rindo quando achava graça e chorando quando ficava triste. Seu coração era estéril, incapaz de gerar amor novamente. A frieza era seu escudo.
Edward respirou fundo e tomou coragem de fazer a pergunta que estava presa em sua garganta para a mãe. Eles estavam no aeroporto, de onde Esme embarcaria para a Inglaterra, depois de assistir a formatura do filho.
- Mãe, poderia me passar o telefone de Isabella? – Ao terminar, olhou para o chão, evitando o olhar de Esme.
Uma das poucas informações que Edward tinha de Bella era que ela tinha se mudado da mansão pouco tempo depois de sua mudança para os Estados Unidos.
Esme não acreditou no que ouvia.
- Meu Deus, Edward, o que você ainda quer com essa garota? Pensei que nem se lembrasse dela mais.
Edward teve de contar até dez para não gritar que não houvera um único dia, desde que a deixara, que não se lembrasse, com o peito sangrando, de seu sorriso meigo, de seus cabelos dourados e do verde de seus olhos; mas preferiu calar-se. Não queria discutir com a mãe.
- Eu não sei onde Bella está. – Esme falou meio irritada.
- Como assim não sabe? – Edward perguntou indignado. – Ela é filha de sua melhor amiga, mãe; neta de Norma. Não quer que eu acredite que você não dá nenhum apoio para ela, principalmente financeiro.
- Edward, Bella foi embora de nossa casa sem ao menos se despedir. Aquela ingrata não deixou nenhuma informação sobre seu destino. Como poderíamos ajudá-la se ela não nos queria por perto?
Edward fitou Esme por alguns segundos, tentando encontrar nela algum resquício, mínimo que fosse, de compaixão. Viu diante de si as conseqüências de se carregar o sobrenome Cullen. A mãe tinha perdido grande parte de sua humanidade e hoje já parecia uma fotocópia do pai.
- Bella não foi embora porque quis, nós a expulsamos de nossas vidas, como se ela fosse algo que nos incomodasse!! Por Deus, mãe, ela era apenas uma criança! Deviam ter procurado-a, chamado-a de volta.
As palavras de Edward saíram sofridas. Agora entendia a dimensão do estrago que tinha feito na vida daquela pobre menina. Por sua causa ela tinha se jogado no mundo sozinha, sem amparo, sem dinheiro. Imaginou as dificuldades que ela teve de passar, o desespero de não poder contar com ninguém. Como será que ela estava vivendo agora? Se é que estava vivendo...
Acusava a mãe de omissão, mas no fundo sabia que o maior responsável por tudo isso era ele mesmo. Fora ele quem a abandonara à própria sorte. Era dele que ela esperava amor e proteção.
Edward não tentou segurar as lágrimas que escorriam por seu rosto. Deixou que caíssem livremente, esperando que elas aliviassem a dor em seu peito. Como pôde ter feito tanto mal àquela garota tão frágil e doce que o amava? Ela não merecia o que tinha lhe feito... Não merecia mesmo!
- Eu ouvi algo sobre ela ter vindo para os Estados Unidos, mas é só o que sei.
Esme despediu-se do filho e entrou preocupada no avião. Temia que ele estivesse desenterrando um problema que julgava encerrado.
Assim que Edward chegou em casa, ligou para Emmet, seu sócio e amigo.
- Arruma um detetive particular para mim. Preciso encontrar Bella. – Foi curto e direto.
- Demorou, heim cara! Até que enfim vai tomar uma atitude de homem.
Emmet conhecia toda a história de Edward e sempre foi a favor do amigo lutar pelo amor que sentia por Bella.
- Minha mãe falou que ela está aqui, Emmet. Eu preciso vê-la!
- Vou falar com meu padrinho. Ele deve conhecer um bom detetive.
O padrinho de Emmet era um ex-agente do FBI. Desde que perdera o pai, que também era do FBI, ele sempre pode contar com o carinho e apoio dele. Eram muito próximos.
Dois dias depois, Edward estava sentado em um bar, conversando com o homem que procuraria Bella para ele. Ele não tinha sequer uma foto para ajudar nas buscas. Passou apenas o nome, idade, características físicas e um envelope contendo dez mil dólares para que o serviço começasse a seu efetuado. As outras parcelas só seriam pagas se Conrad Allister, o detetive, descobrisse o paradeiro de Bella.
Bella viu Mike sair com lágrimas nos olhos de seu pequeno apartamento. O namoro deles não estava dando certo.
Mike queria mais envolvimento por parte dela, mas além de uma sincera amizade, sobrava muito pouco de si para oferecer-lhe.
Bella gostava dele, sentai-se bem recebendo seus carinhos, mas ainda assim mantinha uma distância segura do sentimento chamado “amor”. Tinha medo dele. Sentia-se culpada por fazê-lo sofrer, mas mesmo se esforçando, ainda vivia atormentada pelos traumas do passado.
Marcaram um jantar no outro dia para conversarem melhor. Precisavam de um tempo para refletirem sobre tudo que estava acontecendo entre eles.
O encontro romântico não ajudou muito. Os fatos falavam por si.
Bella beijou Mike e pediu desculpas mais uma vez.
Sete meses depois de começarem a namorar, terminaram. Na verdade foi Mike quem terminou, alegando que a amava demais para suportar tanta indiferença.
Conrad bateu a foto sem flash, sabendo que mesmo assim sairia boa. Seus equipamentos eram o que tinha de mais moderno no ramo da investigação particular.
A fotografia era a última coisa que faltava para anexar em seu primeiro relatório. Quarenta dias depois de ser contratado ele já tinha todas as informações sobre Isabella Swan.
No final da semana ele entregaria uma pasta contendo um breve histórico da vida daquela garota para Ed Masen.
...”E cada vez que eu fujo,
eu me aproximo mais
E te perder de vista assim
é ruim demais
E é por isso que atravesso o teu futuro
E faço das lembranças
um lugar seguro...
Não é que eu queira reviver
nenhum passado
Nem revirar um sentimento revirado
Mas toda vez que eu procuro
uma saída
Acabo entrando sem querer
na tua vida”...
Edward fitou a foto, sentindo as mãos tremerem. Bella estava de perfil, sentada ao lado de um homem loiro, que sem a menor dúvida, tratava-se de seu namorado.
Se não fosse seu esforço absurdo em se manter calmo, teria desmaiado bem ali na frente do detetive.
Ver o amor de sua vida de mãos dadas com outro homem era algo para o qual não tinha se preparado. Sabia, claro, que Bella tinha seguido com sua vida, mas constatar que ela agora era de outro doía tão forte que teve vontade de gritar.
- Kansas? – Imprimiu um tom falsamente casual à voz.
- Sim, Ed. Ela se mudou para nosso país há dois anos. Está cursando Administração de Empresas na Faculdade Estadual de Lawrence e trabalha em uma loja de conveniências à noite. Este é Mike Newton, seu namorado. Eles estudam juntos. Neste relatório tem todas as informações que consegui coletar da sua vida no Kansas.
- Ótimo trabalho, Sr. Allister. Aqui está a segunda parte do valor que combinamos. De agora pra frente o pagamento será mensal e será depositado depois que tiver mandado o relatório. Não há mais necessidade de fotos.
Edward queria acompanhar a vida de Bella dia-a-dia, mas não queria mais sentir aquela dor que ainda o massacrava de ter visto-a abraçando outro. Gastaria um bom dinheiro para alcançar seus objetivos. Não conseguiria mais ficar sem ter notícias de seu raio de sol. Pela primeira vez, depois de cinco anos, sentiu-se vivo, mesmo que essa vitalidade tivesse sido despertada pela dor de saber que sua garotinha tinha se tornado uma mulher. Não se sentia mais tão só.
Assim que ficou só, chamou Emmet para conversar. Gostava de confidenciar com o amigo.
- E aí, quando vai procurá-la? – Emmet perguntou impaciente.
- Não sei se eu tenho o direito de aparecer na vida dela agora. Não posso passar cinco anos sumido e de repente simplesmente aparecer e dizer que estou arrependido, bagunçando toda a vida dela.
- Essa moça deve te odiar, Ed. Hã... Desculpe a franqueza, cara.
- É, ela deve me odiar mesmo...
- Você só vai saber se for conversar com ela. Até lá, tudo será suposições.
- Ela tem uma vida muito sofrida, Emm. Trabalha à noite e estuda o dia todo. Mora mal e ganha pior ainda. Tudo isso é culpa minha. Ela não precisava estar passando por tudo isso. Só está assim porque teve de sair da nossa casa, desiludida com o que fiz com ela.
Edward não sabia que a outra opção que deram à Bella incluíai limpar e polir a prataria da mansão dos Cullen.
- Vai lá e conserta seu erro, cara! Dê a ela a vida que ela merece. Você tem dinheiro, pode dar-lhe tudo o que lhe falta.
- Têm estragos que são irreversíveis, Emm. O que eu fiz não tem perdão.
- Às vezes eu duvido que você ame essa mulher como vive dizendo, Ed. Nunca vi uma pessoa tão pouco disposta a lutar por um amor como você.
- Eu sempre fui um covarde... E agora vejo que ainda sou.
- Você tem uma dívida com essa garota, Ed. Prometeu fazê-la feliz e um dia terá de cumprir.
Edward olhou a foto mais uma vez e teve certeza que não a procuraria. Não suportaria ver o ódio em seu rosto quando a encontrasse. Preferia se lembrar de seu sorriso meigo e tímido, quando se encontravam rapidamente na cozinha ou no jardim. Tinha tanto amor em seu rosto naquela época... Mas ele não soube valorizar a riqueza daquele sentimento puro e sincero, concluiu despedaçado.
Depois de Mike, bem depois, veio Tyler. Desta vez Bella achou que conseguiria mergulhar de cabeça naquela relação, mas estava enganada.
Com Eric teve ótimos momentos. Viajaram juntos para New York e se divertiram como nunca. Não tinha tempo para ficar triste ao lado dele, riam o tempo todo. Eric era um palhaço.
Risadas à parte, faltou amor mais uma vez. Mesmo travando uma luta interna para resgatar sua capacidade de amar, Bella perdeu mais um namorado. Já não agüentava mais ser cobrada por não fazer a sua parte nas relações. O que queriam dela ela não tinha pra dar, justificava-se.
A cada relatório que recebia, cinco mil dólares saíam da conta de Edward Cullen em nome de Conrad Allister.
A pilha de trinta e seis pastas, perfeitamente arrumadas na bancada de seu quarto era a prova da persistência de Edward em acompanhar a vida de Bella. Sempre esperava ansiosamente o fim do mês para saber o que sua amada fizera no decorrer daqueles trinta dias.
Acompanhara cada promoção, cada namorado, cada resfriado, cada viagem, enfim, cada acontecimento importante da vida dela no decorrer destes três anos.
Também tivera suas conquistas, namoradas, viagens... Mas nada disso era mais importante para Edward do que saber que em algum lugar, ainda que distante dele, Bella levava sua vida com um pouco mais de facilidade, desconhecendo as ajudas que ele lhe proporcionara. Uma delas foi, através de amigos influentes, ter conseguido um emprego melhor para ela, onde ganharia o dobro do anterior e trabalharia menos horas.
Hoje era sua formatura.
Edward passara a semana toda lutando contra a vontade de ir vê-la. Daria sua vida para poder estar sentado na platéia, aplaudindo-a quando recebesse seu diploma.
Os últimos relatórios que ele recebera informavam que Bella estava namorando um colega de trabalho. James era seu nome e parecia que estavam se dando muito bem. O ciúme mais uma vez estava dilacerando-o.
...”Dói,
de tanto medir a distância ,
saber que não vou te tocar
além da lembrança”...
Bella acordou ansiosa. Finalmente chegara o dia de sua formatura. Sentou-se na cama, beijou a foto da mãe que ficava no porta-retrato na mesinha ao lado da cama e o abraçou. Aquele gesto simbólico era uma forma de amenizar a falta que sentia dos braços quentes e ternos de Renée.
- Eu consegui, mãe! Hoje vou me formar. Foi por você que eu lutei. – A voz de Bella começava a sair embargada pelo choro, enquanto conversava com a fotografia. – Queria tanto que estivesse aqui, mãezinha, mas sei que onde quer que esteja, estará feliz por mim. Esta vitória é para você!
Limpou as lágrimas e foi tomar banho. Seu dia seria atribulado. Tinha ganhado folga no serviço, mas ainda teria de enfrentar salão, depilação, manicure... Queria estar bem linda na festa de formatura.
Na hora marcada, James chegou para buscá-la. Era um homem lindo e Bella pensou que realmente ele era alguém com quem podia se casar, se... Abandonou o pensamento. Era tanto “se”... Se fosse capaz de amar... Se conseguisse se entregar totalmente àquele amor... Se seu coração o deixasse entrar...
Bella riu e chorou naquela noite. Uma parte dela vislumbrava um futuro promissor, mas a outra parte ainda cultuava um passado que não voltaria mais, onde a mãe, a esperança e a felicidade compunham um cenário perfeito.
Não teve com quem tirar as tradicionais fotos de família, porém não se sentia completamente sozinha, em suas fotografias sempre estava acompanhada de suas fiéis e constantes companheiras: As lágrimas.
Os meses foram passando e a vida de Bella começava a melhorar cada vez mais. Seu namoro com James estava durando mais que os outros. Grande parte deste êxito se devia à paciência dele com a namorada.
James não cobrava nem forçava a barra com Bella. Amava-a desesperadamente e tinha convicção de que um dia conseguiria transpor as barreiras que ela levantara em seu coração.
Enquanto isso a vida de Edward se resumia ao trabalho e a Bella. Preenchia todo o vazio de seus dias com as informações que recebia do detetive.
A pilha de pastas só ia aumentando e sua vontade de encontrá-la também.
Profissionalmente Edward estava muito bem. A firma deles crescia mais a cada ano.
Sua relação com os pais ficava cada vez mais fria e distante, se limitando a vê-los nos finais de ano, no Natal.
Não contou a eles nada sobre Bella. Não os queria perto dela, nem enchendo seu saco com aquela conversa de “ela não era a mulher certa para você”.
Já tinha se passado quase cinco anos desde que Conrad Allister intermediava a relação platônica de Edward com Bella.
Seu coração gritava que queria vê-la, mas sua cabeça dizia que não era a coisa certa a fazer.
Edward já não agüentava mais. A saudade rasgava sua carne. A costumeira covardia que o acompanhava desde a juventude estava dando lugar a um espírito destemido, livre e convicto do que queria.
Entre o medo da rejeição e a vontade alucinante de se encontrar com Bella, Edward optou pelo meio termo: O telefone.
Numa manhã de domingo, Edward abriu a qüinquagésima oitava pasta de sua pilha e discou o número de celular que estava anotado ali.
Seu coração dava pulos no peito enquanto o sinal indicava a chamada em curso. Sentou-se com medo de não se segurar em pé.
- Alô! – Uma voz doce atendeu.
1 comentários:
Ai, estou louca para ver o próximo capítulo.
Por favor não demore muito para postar.
Bjs
Aline
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